terça-feira, 27 de setembro de 2016

AS HISTÓRIAS DO LUÍS DE MATOS

                          O Velho Gasparão

O Ti Gaspar, mais conhecido por Velho Gasparão, era um homem muito alto, forte e com uma grande barriga. Toda a sua vida foi Guarda de Pastagens no Monte do Pigeiro. Andava sempre de mochila às costas. Usava calças de cotim e camisa aos quadradinhos pequenos e bota cardada. A camisa era atada mesmo por cima do cinto de cabedal. Era natural de Terena e morava na rua das casas novas, mais ou menos defronte do prédio do Dr. Galhardas. Depois de reformado passou a andar de monte em monte como guardador de gado, em substituição dos maiorais que por qualquer motivo tinham que se ausentar e faziam-no por vários motivos; por doença, casamento ou por falecimento de um familiar ou amigo.
O Velho Gasparão tinha fama de comer muito e pelos vistos tinha também o proveito. Certo dia, o Ti Joaquim Alho que era o cozinheiro do Monte do Pigeiro viu que o Velho Gasparão se aproximava do monte e disse para os presentes.
– Olhem! Vem além o Velho Gasparão. O que é que acham? Vamos pregar-lhe uma partida?
Todos concordaram.
Quando o Velho chegou, como pessoa educada que era, cumprimentou com um “Boas Tardes”, ao que todos corresponderam.
– Então Ti Gaspar já ceou hoji?
– Nã senhori, mas comia umas sepinhas, se prá aí houvesse.
– Então nã há-de havêri Ti Gaspari!. Vou-lhe fazêri uma açorda, disse-lhe o cozinheiro.
– Está bem. Munto obrigado.
Era normal, que nos montes houvesse sempre uma panela de ferro com água ao lume. O Cozinheiro começou de imediato a pisar os tempêros, que eram poejos e pôs-lhe duas ou três malaguetas para testar o sabor e para ver até que ponto o estômago do bom do Ti Gaspar aguentava, pois tinha fama de comer muito. Enquanto esperava que a água fervesse em cachão, migou um pão de quilo para as sopas da açorda, colocou os temperos e o azeite num alguidar de barro, certamente comprado ao Ti Firmino ou ao irmão que eram louceiros do Redondo e que andavam por aldeias e montes a vender loiça e abafou a açorda para o pão crescer bem. Passados uns cinco ou dez minutos, já o pão tinha crescido quase para o dobro. Pensou o Ti Joaquim Alho. Está mesmo boa. Hoje é que vamos ver até que ponto é que o Velho Gasparão come muito.
O cozinheiro chamou então o bom do homem para se sentar à mesa, que a açorda estava pronta.
Enquanto o Velho Gasparão ía comendo a açorda, os outros, com os olhos arregalados por tão grande apetite, assistiam a todo este quadro. O Velho comeu a açorda toda e, também bebeu o caldo.
Perguntou-lhe o cozinheiro.
– Então Ti Gaspar a açorda estava boa?
Se estava! Só foi pena o caldo ter um bocadinho de picante a mais.
Luís de Matos


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